Estudo do Ministério da Saúde revela crescimento e transformações no mercado de trabalho da Enfermagem no Brasil

Foto: CNTS
A Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn) participou, no dia 11 de novembro, do lançamento da primeira edição do livro Demografia e Mercado de Trabalho em Enfermagem no Brasil, realizado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). A publicação integra o projeto Demografia da Enfermagem Brasileira, desenvolvido pelo Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES), em parceria com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e universidades públicas.
A profa dra, presidenta da ABEn na gestão 2020-2022, Sônia Acioli representou a ABEn no evento, que reuniu pesquisadores, gestores e representantes de entidades da Enfermagem para discutir os resultados do estudo.
A obra apresenta uma análise abrangente e inédita sobre a força de trabalho em Enfermagem no país, abordando aspectos como formação profissional, perfil sociodemográfico, condições de trabalho e tendências do mercado de emprego entre 2010 e 2022. O levantamento, coordenado por equipes da UERJ, UFMG e Fiocruz, foi elaborado com base em grandes bases de dados nacionais, como a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) e o Caged.

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Acesse os documentos completos aqui: https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/sgtes/dimensionamento-em-saude/demografia-da-enfermagem/publicacoes
Crescimento expressivo da força de trabalho em Enfermagem
Entre 2010 e 2021, o número de vínculos de trabalho formais da Enfermagem cresceu quase 44%, ritmo dez vezes superior ao crescimento da população brasileira no mesmo período. O estudo confirma a expansão contínua do contingente de enfermeiros e técnicos de enfermagem, enquanto os postos de auxiliares apresentaram redução, indicando uma transição para equipes mais qualificadas e com maior escolaridade.
Esse movimento é reflexo de políticas de incentivo à formação técnica e superior, bem como de mudanças nas práticas e exigências do sistema de saúde. A expansão dos vínculos, contudo, não representa necessariamente aumento proporcional de profissionais, já que muitos exercem mais de um vínculo de trabalho, realidade comum na Enfermagem brasileira.
Envelhecimento e transformações no perfil da categoria
O estudo revela também um padrão de envelhecimento entre os profissionais de Enfermagem, invertendo a tendência histórica de uma categoria predominantemente jovem. As faixas etárias mais avançadas vêm se ampliando, o que pode estar relacionado à estabilidade conquistada por profissionais com vínculos formais e à dificuldade de inserção dos mais jovens no mercado.
A análise reforça a importância de políticas que assegurem condições de trabalho adequadas, saúde ocupacional e aposentadoria digna, considerando o impacto do envelhecimento sobre a reposição de quadros e a sustentabilidade da força de trabalho.
Diversidade racial e desafios de equidade
Outro dado relevante é o aumento da participação de pessoas negras (pretas e pardas) entre os profissionais da Enfermagem. Esse movimento sinaliza avanços na inclusão e na redução do racismo institucional nas bases de dados e no mercado de trabalho, embora persistam desigualdades salariais e de acesso a determinados postos.
A análise destaca que homens brancos recebem melhores salários que mulheres brancas, que, por sua vez, têm rendimentos superiores aos de homens e mulheres negras. O monitoramento dessas desigualdades é considerado essencial para orientar políticas públicas que enfrentem as opressões de gênero e raça de forma interseccional.
Diferenças entre os setores público e privado
Embora o setor público ainda concentre a maior parte da força de trabalho da Enfermagem, o setor privado apresentou as maiores taxas de crescimento proporcional em todas as categorias. O estudo relaciona esse avanço à financeirização e expansão dos serviços de saúde privados, impulsionadas pela entrada de capital estrangeiro e por estratégias de fusões e aquisições.
A combinação de restrições orçamentárias no setor público — especialmente após a Emenda Constitucional nº 95, que instituiu o teto de gastos — e de investimentos crescentes no setor privado cria uma dualidade que pode ampliar as desigualdades de acesso e qualidade da assistência em saúde.
Impactos da pandemia de Covid-19
Entre 2020 e 2022, a pandemia provocou aumento expressivo na contratação de enfermeiros e técnicos, principalmente no setor público, em razão da necessidade de ampliar equipes hospitalares, unidades de terapia intensiva e campanhas de vacinação.
Entretanto, o estudo observa uma desaceleração nas contratações a partir de 2022, especialmente entre os auxiliares de Enfermagem, indicando o efeito dos cortes orçamentários após o fim do período emergencial.
Setor filantrópico em expansão e novas parcerias com o SUS
O levantamento aponta também um crescimento expressivo de 226% no número de enfermeiros atuando em instituições do setor sem fins lucrativos, impulsionado por parcerias entre o Sistema Único de Saúde (SUS) e organizações filantrópicas. Essas parcerias têm ampliado a capacidade de atendimento em regiões com carência de profissionais e infraestrutura, reforçando a importância das ações complementares previstas na Lei nº 8.080/1990, que regulamenta o SUS.
Regionalização e desigualdades persistentes
As análises regionais mostram que as dinâmicas da Enfermagem variam fortemente entre as regiões brasileiras, refletindo desigualdades históricas de acesso à formação, inserção no mercado de trabalho e distribuição da força de trabalho em saúde.
Enquanto regiões com maior infraestrutura e oferta de ensino superior, como o Sudeste, concentram profissionais com maior qualificação, outras regiões, especialmente o Norte e o Nordeste, ainda enfrentam carência de trabalhadores e dependência de mão de obra de nível médio.
Afastamentos e desgaste profissional
Outro ponto de destaque é o aumento expressivo dos afastamentos por motivos de saúde entre profissionais de Enfermagem. Em 2012, foram registrados 151 mil afastamentos, o equivalente a 12,5% dos postos de trabalho. Em 2021, esse número saltou para 470 mil afastamentos, correspondendo a 24,3% dos vínculos formais.
Embora a pandemia tenha intensificado esse quadro, o maior índice ocorreu em 2019, antes da crise sanitária, o que indica uma tendência de deterioração das condições de trabalho. A proporção de afastamentos relacionados diretamente ao trabalho nunca ultrapassou 5% da série histórica, possivelmente por subnotificação e descaracterização das doenças ocupacionais.
Um retrato essencial para o futuro da profissão
A publicação Demografia e Mercado de Trabalho em Enfermagem no Brasil marca um avanço significativo no conhecimento sobre a força de trabalho da categoria, oferecendo subsídios fundamentais para o planejamento de políticas públicas, a valorização profissional e o fortalecimento do SUS.
Ao revelar tendências, desigualdades e desafios, o estudo reforça que compreender a dinâmica da Enfermagem é compreender o próprio funcionamento do sistema de saúde brasileiro. O levantamento se torna, assim, uma referência estratégica para gestores, pesquisadores e entidades de classe, contribuindo para o desenvolvimento de um futuro mais justo e sustentável para a Enfermagem e para a saúde da população brasileira.
Acesse os documentos completos aqui: https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/sgtes/dimensionamento-em-saude/demografia-da-enfermagem/publicacoes


